Um ácido e divertido retrato da mecânica da sociedade de consumo. Acompanhando a trajetória de um simples tomate, desde a plantação até ser jogado fora, o curta escancara o processo de geração de riqueza e as desigualdades que surgem no meio do caminho. Gênero Documentário, Experimental. Diretor Jorge Furtado. Elenco Ciça Reckziegel. Ano 1989. Duração 13 min. Cor Colorido. Bitola 35mm
Ficção em formato documental, filme de Jorge Furtado continua estranhamente contemporâneo – com um caráter visionário, o qual se situa na realidade que a obra retrata e ainda se faz, e cada vez mais, presente. Título tornou-se um ícone, dando origem a uma nova forma de narrativa cinematográfica."A câmera mostra exatamente o que o texto diz, da forma mais didática, óbvia e objetiva possível. Quando o texto fala em números eles são mostrados num quadro negro ou em gráficos." Esta foi, inicialmente, e para mim ainda é, a sinopse primária de um dos curtas-metragens brasileiros mais famosos no mundo, Ilha das Flores, de Jorge Furtado, que completa em 2009 seus 20 anos de lançamento.
O título tornou-se um ícone estético, dando origem a uma nova forma de narrativa cinematográfica no Brasil e influenciou muita gente em boa parte do planeta. Para marcar a data, o filme será exibido neste sábado, às 12h20min, no programa Curtas Gaúchos, da RBS TV. Haverá reprise na TVCOM domingo, às 8h15min, e à meia-noite.
Assista ao curta-metragem Ilha das Flores no site Porta Curtas: http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=647).
Ficção em formato documental, Ilha das Flores (1989) continua estranhamente contemporâneo – com um caráter visionário, o qual se situa na realidade que a obra retrata e ainda se faz, e cada vez mais, presente. É difícil ainda hoje não vê-lo como um documentário. O filme apresenta, em tintas cruas, o círculo do consumo em suas fases básicas e presentes, narrando em off a trajetória de um tomate, desde sua plantação até ser descartado, no aterro sanitário da Ilha das Flores, na região metropolitana de Porto Alegre.
Ilha das Flores foi amplamente reconhecido, recebendo vários prêmios, entre eles o Urso de Prata no Festival de Berlim 1990; Prêmio Crítica e Público no Festival de Clermont-Ferrand 1991; e Melhor Curta no Festival de Gramado 1989. Também rendeu reclamações de figurantes locais, que disseram que "não era nada daquilo" que se via no filme. Confusão entre realidade e ficção, eis o que a linguagem desta obra marcou na História do cinema contemporâneo.
A produção, da Casa de Cinema de Porto Alegre, tem o roteiro inspirado na linguagem do discurso científico – com percentuais, gráficos e olhar distante do objeto de observação, cuja raiz deu origem ao relato documental-jornalístico. O filme, embora pareça, mas não é, um documentário, mostra como a economia gera relações desiguais entre os seres humanos. E também mostrou como uma linguagem pode parecer o que não é. No limite, mostrou o que é arte.
Poder-se-ia dizer que Furtado quis fazer filosofia da linguagem, exercitando paradoxos, ou, quem sabe, talvez, um manifesto. Sobre um fundo preto há, em branco, por exemplo, o seguinte: "Este não é um filme de ficção". "Esta não é a sua vida." "Deus não existe." Na América cristã, ninguém foi tão longe no cinema até hoje. Ilha das Flores foi eleito pela crítica européia, em 1995, como um dos 100 mais importantes curtas-metragens do século 20.Na arte do cinema, no âmbito estético e do discurso, pode-se dizer ainda não há nada igual. (Simone Marques)
Jorge Furtado e o cinema construtivo
Em sua monumental e já célebre dissertação sobre o cinema documentário brasileiro1, Sílvio Da-rin analisa os documentários de Jorge Furtado no mesmo capítulo dedicado a Arthur Omar, e os dois sob a égide do cinema reflexivo. Cinema reflexivo seria aquela espécie de documentário que não considera mais a câmera como espelho privilegiado da realidade, mas como objeto problemático, frágil, que merece que se mergulhe por um tempo no problema da representação documentária.
Exemplo típico é Congo, de Arthur Omar que, ao invés de ser o documentário etnográfico que todo mundo espera de um filme com esse nome, não nos dá nenhuma imagem desse ritual folclórico, mas antes enche a tela de questionamentos a respeito da representabilidade de um movimento vivo para a tela. Se inserem, então, na categoria de filmes reflexivos aquelas obras que problematizam pela própria linguagem do documentário as "verdades" e os "documentos" que elas estão trazendo à luz (do público, da tela).
Leia a crítica cinematográfica a Ilha das Flores no site da revista Contracampo.http://www.contracampo.com.br/47/furtadocumentario.htm
1. Sílvio Da-rin,O Espelho Partido – Tradição e transformação do documentário cinematográfico. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro, ECO/UFRJ, 1995.
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